Tornei-me Líder. E agora?

Provavelmente um dos momentos mais críticos na trajetória de um gestor é aquele em que ele é informado de que assumirá, pela primeira vez, a liderança de uma equipe. Este artigo tem a intenção de abordar aspectos importantes dessa transição, mas certamente pode gerar boas reflexões àqueles profissionais que já lideram equipes há algum tempo, mas que, nem sempre param para pensar sobre as prioridades, quando se está prestes a  assumir uma nova equipe de trabalho.

De maneira geral, os profissionais relatam, sobre esse momento, sentimentos intensos e, com frequência, estranhos entre si: excitação, medo, alegria, angústia, motivação, preocupação… A virada de chave entre a atividade de liderar apenas a si próprio e aquela que envolve a liderança de outras pessoas provoca uma mistura de sensações, derivada da oportunidade que se abre, a partir do momento em que se entrega pessoas e projetos para condução por um novo gestor e a responsabilidade de fazer as coisas darem certo. Não são raras as situações em que um determinado colaborador, antes elogiado por todos, na organização, entra em uma espiral perturbadora, quando alçado a uma posição de liderança. Nesse caso, diz-se que a empresa perdeu um excelente técnico para ganhar um gestor sofrível.

Antes que eu venha a criar expectativas não realistas, vale antecipar: não tenho a receita do bolo. Não acredito em livros que têm na capa títulos como “X passos para uma liderança de sucesso”. Nesses casos, ou o título representa uma propaganda enganosa ou o conteúdo é baseado em uma pretensão discutível. Aqueles que já lideram equipes há muito tempo sabem que não há um método infalível para se liderar equipes. Como exemplo, quem acompanha futebol sabe que técnicos consagrados às vezes fracassam diante do desafio de liderar determinadas equipes. É claro que a vivência e a experiência são fatores importantes para qualquer profissional, incluindo os gestores, mas não é possível garantir que a mesma estratégia que deu certo em uma determinada empresa, segmento ou região, dará certo em outras circunstâncias. Aliás, as revistas de negócios estão recheados de estudos de caso envolvendo catástrofes provocadas por gestores que repetiram receitas em ambientes diferentes e se deram mal. Portanto, neste artigo vamos abordar alguns ingredientes relevantes, que podem contribuir para uma transição mais segura, sem desconsiderar tantas outras variáveis que podem estar presentes, em cada situação.

Para tornar o texto mais didático, chamarei esses ingredientes de “os sete passos para a virada de chave”. São eles:

Passo 1: Acenda a luz

Quando um profissional é convidado a assumir uma equipe, é natural que seja tomado por uma euforia e tanto, e não tenho nada contra que isso seja vivenciado pelo novo gestor. Afinal, muitas vezes esse momento é consequência de muito esforço, de muito desejo, de muita luta. Portanto, entendo que é um direito, sim, curtir esse momento. O novo gestor só não deve deixar que essa euforia comprometa o conhecimento que ele precisa buscar, sobre os novos desafios, antes mesmo de sentar-se na nova cadeira. Em qualquer estrada, dirigir sem mapa e sem faróis acesos, à noite, é um convite para acidentes. Portanto, se você vai assumir uma nova posição, converse com todas as pessoas possíveis, para ouvir o que elas têm a dizer sobre o que te espera. Não entenda cada resposta ou cada informação como “verdade absoluta”, mas trate-as como insumos, para que você não chegue totalmente no escuro, e possa, como mais serenidade, ir formando sua própria visão, ao longo do tempo.

Comece, se possível, por seu novo líder. Pode parecer meio esquisito, mas, acredite, se você não fizer perguntas a quem está te nomeando, nem sempre você terá a noção adequada sobre aspectos importantes de seu trabalho. O que ele espera de você? Quais são as expectativas, para o período em que você estiver à frente da equipe? Quais são as prioridades que ele enxerga, em sua nova área? O que pode fazer com que você se destaque nessa nova missão? Como ele gosta de se comunicar contigo? Há algo que ele vê, em sua nova área, que mereça destaque, seja pelo lado das oportunidades, seja pelo lado de preocupações ou riscos? Enfim, busque conhecer como o seu gestor enxerga os desafios que você assumirá e o que ele espera de você. E, saiba, tem líder que vai te dizer tudo isso – e mais – sem que você pergunte nada, mas tem líder que só vai te contar tudo isso se você perguntar.

Fale também, se possível, com o gestor que está deixando a área. Embora isso nem sempre seja viável, faça os esforços necessários para viabilizar essa conversa, antes de assumir sua posição. Entender como ele vinha conduzindo os projetos, o que ele pretendia fazer, caso continuasse lá, qual a percepção sobre as pessoas, quais cuidados precisam ser levados em consideração, além de outras coisas que ele julgue oportuno te contar são elementos muito relevantes para que você construa uma imagem inicial, da equipe, dos desafios e dos recursos com os quais você contará.

Converse, também, com seus futuros pares, com os gestores que coordenam as áreas parceiras. Procure ouvi-los sobre quais projetos estão sendo conduzidos em comum, sobre o que eles esperam de sua equipe e aproveite para pedir-lhes o apoio necessário, em sua chegada. Sempre que pedimos ajuda e oferecemos a nossa construímos pontes com nossos interlocutores.

E, tão logo possível, converse com o seu time. Demonstre a satisfação que você está sentindo, em trabalhar com eles e busque entender, a partir deles, quais os principais desafios a serem vencidos, em conjunto, quais as oportunidades a serem exploradas e quais as expectativas que eles alimentam, com a sua chegada.

Talvez você já tenha percebido que, nessas primeiras conversas, minha sugestão é que você ouça muito mais do que fale. Não é o que você já sabe que vai melhorar a iluminação da estrada que você vai trilhar. É tudo aquilo que eles entregarão para você, em informações, percepções, sentimentos e expectativas. Se você for um bom ouvinte, e tratar tudo aquilo que você ouviu, nessas conversas, com atenção e humildade, perceberá que, agora, aquele já não parece um ambiente desconhecido. Ainda que algumas informações pareçam um tanto desencontradas, o que você elucidará com o tempo, o conjunto maior de insumos que você recebeu te permitirá assumir sua posição com muito mais segurança e confiança. Sem contar que, a partir dessas conversas, você também já terá construído os primeiros degraus no relacionamento com as pessoas que contribuirão para o sucesso que você busca alcançar em sua nova missão.

Passo 2 – Feche os contratos

         Os primeiros dias em uma nova equipe representam uma excelente oportunidade para que você, como novo gestor da área, alinhe com seus liderados o ambiente de trabalho para o qual pretende contribuir. Palavras como comprometimento, cumplicidade, transparência, crescimento mútuo, trabalho em equipe, etc. são sempre muito utilizadas nos “discursos de posse”, mas nem sempre com a vida e intensidade que mereceriam. Não tenho nada contra a uma primeira reunião, para um alinhamento inicial do trabalho, mas entendo que sempre que conseguimos olhar nos olhos de uma outra pessoa, os compromissos se amplificam. Então, faça todo o esforço possível para conversar com cada colaborador, individualmente, da maneira em que você achar mais conveniente. Pode ser um bate papo mais informal, no final de cada expediente, pode ser almoçando com cada um, enfim, a forma pode variar de ambiente para ambiente. Mas, procure ter essa conversa que permita olhar nos olhos de seus liderados, para dizer o quanto você quer contribuir para com cada um deles e o quanto você precisa da contribuição deles para que a equipe atinja os seus objetivos. Busque alinhar a maneira como vocês vão conversar, abra o espaço para que as sugestões e os feedbacks sejam abundantes e transparentes e discuta quais compromissos vocês precisam fechar, para que tudo ocorra da melhor forma, no dia a dia. Eu converso com líderes que me dizem, após seguir minha sugestão e realizar conversas como essas, que as relações mudaram da água para o vinho, ao investirem nesses diálogos de aprofundamento nos compromissos de trabalho. Em qualquer relação humana, todas as vezes em que nos dispomos a conversar, com a intenção de construir compromissos mútuos para contribuir nos desafios comuns, subimos alguns degraus na capacidade de realizar o que precisa ser feito.

Passo 3 – Abra as portas

         É cada vez mais incomum e estranho percebermos “salas fechadas” no ambiente de trabalho. O próprio layout dos espaços já vêm sendo idealizados para estimular a integração e interação entre os integrantes da equipe. Portanto, não espero que você, de fato, venha a ter uma sala para chamar de sua, mas aqui o reforço é para o comportamento que sugerimos que você adote, junto à sua equipe. Ande pelas “baias”, sente com seus liderados, buscando entender as particularidades das rotinas, faça perguntas, frequente os corredores e os “cafezinhos”, visite as áreas parceiras. Se sua equipe visita clientes, escolha algumas visitas para  acompanhá-los, alternando, obviamente, as companhias. Eu sei que pode parecer complicado ter que entender todo o processo da área, os relatórios, os manuais, etc. e ainda “gastar” tanto tempo para estar com as pessoas. Mas, acredite, não é “gasto de tempo”, é investimento. Se for necessário, compensa até, em um primeiro momento, você levar parte dos conteúdos para estudar em casa (não será para sempre), para que você possa, de fato, estar o máximo de tempo possível com sua equipe. Além de acelerar o processo de domínio do escopo de trabalho da área, você terá uma oportunidade, assim, de criar uma conexão que não seria possível, se você se dedicasse, predominantemente, a ler normas e a analisar planilhas…

Passo 4 – Construa o plano, junto com eles

         É bastante provável, a não ser que sua nova área esteja nascendo do zero, que já exista um plano de trabalho. E é muito importante que você já o tenha estudado quando de suas conversas iniciais com seu líder e com o antigo gestor da equipe, mas é natural que após algumas semanas no posto, você queira revisitá-lo e desenvolver alguns ajustes, de acordo com o que foi conversado com o seu gestor e com as avaliações que foi possível realizar, a partir do conhecimento mais profundo dos projetos, dos objetivos e metas e das rotinas desenvolvidas. Mergulhe no planejamento, reflita com profundidade, faça suas anotações, mas não construa o plano sozinho. Um dos maiores erros que um gestor pode cometer, nos dias de hoje, é “surpreender” sua equipe com um plano pronto e acabado. Provavelmente eles vão bocejar enquanto você mostra os slides de seu power point e vão te deixar falando sozinho, assim que você permitir que eles se levantem de suas cadeiras. Para que você obtenha a cumplicidade da equipe, nos dias de hoje, é necessário que você compartilhe suas intenções e ouça as contribuições, antes de decidir, sem o que as mudanças que você pretende fazer tende a enfrentar fortes resistências. E mesmo que seu antigo líder ou o atual não te chame para compartilhar, da mesma forma, os seus planos, não se esqueça de que o seu engajamento, como liderado, pode não ser o mesmo de todos os seus colaboradores. Portanto aposte no melhor caminho, conte com sua equipe no planejamento e provavelmente você poderá contar com ela na execução. E não se angustie, falaremos sobre planejamento em artigo específico…

Passo 5 – Coloque os 4 A’s para girar

         Se você acompanha com assiduidade nossos conteúdos, já deve ter acessado nosso artigo “O Ciclo dos 4 A’s”. Se ainda não o fez, acesse o link https://lideresonline.com.br/uncategorized/o-ciclo-dos-4-as/ e leia assim que possível. Então, uma vez ambientado em sua nova área, de acordo com os passos anteriores, invista no ciclo dos 4 A’s, alinhando permanentemente o que precisa ser feito, dando o apoio necessário para que as atividades sejam desenvolvidas da melhor maneira, acompanhando o que está sendo realizado, mesmo antes das entregas efetivas e avaliando o trabalho desenvolvido, reconhecendo o que de bom está acontecendo e ajustando o que precisa ser ajustado. Perceba que para que você desenvolva o ciclo dos 4 A’s com maestria, sua presença junto aos liderados também será fundamental, o que nos leva à conclusão de que um gestor precisa estar o tempo todo, durante todo o tempo, circulando pelo ambiente de trabalho, conversando, observando, apoiando, trocando feedbacks. Como um comandante dos navios modernos, não há mais espaço para se trancar na cabine. É fundamental “sentir” a casa das máquinas, frequentar diferentes lugares no refeitório e, principalmente, conhecer a fundo cada marinheiro…

Passo 6 – Mantenha “o cara” informado

Uma das armadilhas em que podemos cair, quando assumimos uma equipe é que, na ansiedade de fazer as coisas acontecerem e no desejo de mostrar competência e autonomia, nos distanciamos de nosso gestor, enquanto as coisas acontecem. E isso se agrava porque, envolvido também em seus afazeres, nem sempre nosso gestor vai nos chamar para conversar sobre o que está acontecendo. Daí, em algum momento, podemos ser surpreendidos por manifestas insatisfações por mudanças que conduzimos no dia a dia, sem a sua concordância, ou por frustrações quanto aos resultados que estamos apresentando. Assim, mesmo que você tenha a sensação de que as coisas estão caminhando bem, não hesite em buscar espaços de conversas com seu líder, procurando posicioná-lo, inclusive antecipadamente, sobre ajustes que você pretende realizar, bem como solicitando feedbacks sobre como ele está vendo o seu trabalho. Mesmo que ele se mostre super ocupado, procure buscar algum espaço em sua agenda (nem que seja um cafezinho, em pé…) pra que você o situe dos principais aspectos que estão sendo trabalhados. Lembre-se sempre: a mesma iniciativa pode se mostrar uma ótima ideia, se apresentada antecipadamente ao seu gestor ou uma péssima medida, se conhecida por ele por outros meios, depois de implementada. Aquela regra de cumplicidade que destaquei, em relação aos seus liderados, vale aqui, também, para o seu líder, que é um ser humano, tanto quanto os demais, só que, geralmente, com um ego mais carente de afagos.

Passo 7 – Cuidado com o “tá tudo dominado”

Apesar de toda a ansiedade inicial, quando você “vira a chave” para assumir a gestão de equipes, o tempo vai passar. E, com o tempo, o seu conhecimento, a sua experiência e o seu domínio sobre a função vão sendo lapidados, principalmente se você seguir minhas sugestões, destacadas nos seis passos anteriores. E tudo isso é muito bom, porque vai contribuindo para a sua segurança, sua autoconfiança e sua legitimidade na posição. Mas, como sempre há um “mas”… E esse “mas” aqui é sobre o risco de você começar a achar que “está tudo dominado”… Acredite, as pesquisas sobre acidentes de trânsito demonstram claramente que os piores acidentes são provocados pelos motoristas mais experientes. Os iniciantes ralam o para-lama. Os experts capotam…

         Eu sempre digo que um líder deve aliar a experiência do dia 100 com a curiosidade e a inquietude do dia 1… Quando passamos a achar que está tudo dominado e que não há muito mais o que aprender, tendemos a perder o melhor que a ignorância nos permite: paramos de fazer perguntas, deixamos de frequentar as “baias”, reduzimos os pedidos de feedbacks, espaçamos as reuniões com as áreas parceiras e flertamos com a “zona de conforto”, principalmente se os resultados estiverem acontecendo. E, parafraseando o pesquisador e escritor Gary Hamel, “no fruto do sucesso se encontram as sementes do fracasso”.

Portanto, eu desejo que você conquiste o domínio da gestão e que, o quanto antes, se sinta mais seguro para conduzir os seus dias sem tanta ansiedade e insegurança. Mas, ao mesmo tempo, sugiro que você mantenha a humildade do aprendiz, porque, se há uma coisa que pode nos tornar obsoletos rapidamente, é a falta de consciência de que não há um modelo de gestão pronto, e de que a maior habilidade de um líder é manter-se em constante movimento, aprendendo todos os dias, incorporando novos comportamentos, estudando novos conceitos, testando novas técnicas, conversando com pessoas diferentes, enfim, reinventando-se todo o tempo e convidando seus liderados a se desenvolverem juntos com ele. Não se esqueça de que os desafios e as metas não descansam, portanto, sugiro que você durma bem e relaxe sempre que possível no sofá de sua casa, mas em sua missão de liderar, não deixe, nunca, o “vírus da mesmice” te picar, pois ele transmite uma enfermidade grave, nos dias de hoje, e que pode ser fatal para a sua liderança. O antídoto para esse “vírus” é o que eu chamo de inconformismo positivo, onde “subir a régua” não é apenas um estímulo externo, guiado por desafios e metas crescentes, mas é, antes de mais nada, uma busca interna, lembrando o que disse Aristóteles, muitos séculos atrás: “a excelência não é um estado, mas, antes de mais nada, um hábito”.

E aí, o que você achou deste artigo? Quais são suas considerações sobre este conteúdo? Comente conosco e vamos nos desenvolver, juntos.

Pra frente e pra cima, e vamos construindo o nosso sucesso!

Edson Procópio

Lideres Online
Average rating:  
 0 reviews

Deixe uma resposta